Missangas enfeitam pés. Céu vermelho, restos do passado a ensanguentar o presente. A velha sem dentes; a valsa de senhoras descompostas; os príncipes a virarem sapo; o rei a passear rua abaixo sem cortejo, fanfarra, sabendo que vai nu e que a sua princesa nunca foi virgem, nem princesa, apenas rainha dos seus sonhos, que fez promessas àquele que julgava rei dos céus e acabou mortal, numa tumba fria, como a de qualquer lacaio.
Missangas nos pé de bailarina, africa incendiada, um soba menos rei que outros reis passeando pela mão de feiticeiros com as suas aranhas, a desejar bem a todos depois do mal que lhe dá razão, e poder sobre o poder.
As missangas coladas ao teu tornozelo não fazem barulho. O teu corpo ondulante não provoca o meu. Sou eu o feiticeiro. As aranhas são minhas, a lua existiu sempre, escondeu-se hoje para mostrar o que mais certo há no mundo: as estrelas.
O rei está nu.
Rainha de copas maldita, que viras para espadas se o teu rei for de espadas, ou de ouros se for esse o rei que te serve. Cabeças repassadas por sonhos, ilusões passeadas nas terras vermelhas de tanto sangue derramado. Dança a tua valsa senhora, enquanto os dentes não te caírem e tenhas de mentir dizendo-te espírita, espirituosa, a inventar ainda uma ultima dança, o ultimo compasso antes dessa musica que já escutas ao longe em busca da tua carcaça.
A tumba está pronta, meu rei. Fui eu, o teu lacaio, quem te encomendou a tua última cama. Tão fria quanto a minha vai ser.